apresentação

As doenças cardiovasculares são as mais prevalentes e representam a principal causa de morte no mundo ocidental. Cerca de 35% de todas as mortes são causadas por doenças cardiovasculares. Muitas destas doenças podem ser prevenidas e outras tantas tratadas com medicamentos e mudanças de hábitos de vida.

No entanto, naqueles casos mais graves procedimentos para corrigir doenças cardíacas são necessários. Para isto necessitamos de um Serviço de Cirurgia Cardiovascular dentro de um hospital com todos os recursos diagnósticos, ambulatório, centro cirúrgico, pós operatório específico para cirurgia cardíaca (POCC), além de uma equipe multiprofissional treinada e experiente.

No hospital São Lucas dispomos hoje de uma equipe cardiológica treinada especificamente para o pré e pós operatório da cirurgia cardíaca e 10 leitos específicos de CTI para o pós operatório imediato com profissionais de equipe multidisciplinar treinados especificamente para este fim (POCC).

Também temos uma interface muito ativa com a Cardiologia, que também dispõe de 10 leitos com CTI cardiovascular específica (UTICV).

Todos os serviços de apoio como perfusão, enfermagem, fisioterapia, nutrição, banco de sangue, entre outros atuam de maneira sinérgica com o Serviço de Cirurgia Cardiovascular para garantir maior segurança ao paciente.

Desde 2019 todos os procedimentos cirúrgicos são realizados por equipe de anestesistas especificamente treinados para cirurgia cardiovascular, que, além da monitorização usual, realizam ecocardiograma transesofágico. Há um aparelho específico de eco transesofágico 3 D na sala da cirurgia cardíaca e todos os procedimentos são realizados com este, que, além dos resultados da cirurgia, em geral permite uma avaliação mais detalhada da correção cirúrgica, principalmente das plastias valvares, do quadro cardiovascular do paciente, assim como da função ventricular. Poucos hospitais no Rio Grande do Sul dispõem deste equipamento na sala com anestesistas treinados.

 

A equipe cirúrgica tem uma experiência com mais de 15.000 procedimentos e participa desde o início no desenvolvimento de técnicas minimamente invasivas, que oferecem menor agressão cirúrgica aos pacientes. Iniciamos no final da década de 90 com procedimentos endovasculares para o tratamento dos aneurismas da aorta, em 2009 com o implante transcateter de valva aórtica (TAVI), fechamento percutâneo de CIA e FOP e mais recentemente com tratamento transcateter da valva mitral com MitraClip. A parceria com a cardiologia intervencionista, além da recente aquisição de um a parelho de hemodinâmica Philips de última geração nos permitiu avançar nestas tecnologias e hoje representarmos uma das maiores experiências com estes tratamentos no Brasil. Criamos um centro de treinamento onde médicos de diversas regiões do Brasil e exterior participam, no hospital, de workshops específicos.

 

A especialidade da cirurgia cardiovascular teve enormes avanços nas últimas décadas e é responsável por uma ampla gama de procedimentos em doenças cardiovasculares. As mais comuns são cardiopatia isquêmica (angina e infarto) onde há obstrução das artérias coronárias, doença das valvas cardíacas (aórtica mitral e tricúspide), aneurismas da aorta e doenças cardíacas estruturais como CIA, FOP, etc.

 

FECHAMENTO PERCUTÂNEO DE FORAME OVAL PATENTE (FOP)

O forame oval patente (FOP) é uma estrutura anatômica que 20% a 30% da população possui no septo que divide o átrio direito do esquerdo. Normalmente, após o nascimento, há uma separação completa das cavidades cardíacas direitas e esquerdas. Sendo assim, essa abertura (um pequeno túnel) é necessária durante a fase intrauterina para a mistura do sangue no feto. Em 75% das pessoas ele fecha naturalmente após o nascimento. Contudo, em cerca de 25% das vezes permanece aberto até a vida adulta, mantendo uma comunicação entre o átrio direito e o átrio esquerdo. O risco da permanência do forame oval patente é a ocorrência de uma embolização do sistema venoso ao sistema arterial, com complicações neurológicas (AIT, AVC criptogênico) ou periféricas.

 

Na maior parte dos casos, mesmo quando o FOP permanece aberto não há maiores consequências. Em alguns pacientes podem ocorrer embolizações para o cérebro. Essa embolização causa alterações neurológicas temporárias (acidente isquêmico transitório – AIT) ou acidente vascular cerebral (AVC) com alterações maiores e, por vezes, irreversíveis.

O fechamento é indicado nos pacientes que tiveram eventos neurológicos prévios compatíveis com embolização cerebral (AIT ou AVC). Ou seja, onde outras causas para embolização foram excluídas como fibrilação atrial, trombo em átrio esquerdo, doença de carótidas, placas complexas na aorta ou trombofilia. Nestes casos, e com a demonstração de um FOP no ecocardiograma transesofágico de alto risco-com passagem espontânea de bolhas do átrio direito para o átrio esquerdo e por vezes aneurisma de septo interatrial, o FOP deve ser fechado para evitar futuras embolizações e lesões neurológicas. A expressão aneurisma de septo por vezes engana, mas diz respeito a um septo fino e bastante móvel, mas não há risco de ruptura como nos aneurismas arteriais e sim maior risco de embolização pelo FOP. Portanto o aneurisma aqui é diferente dos aneurismas em outras regiões do corpo.

 

Após estabelecido o diagnóstico, sua relação causa-efeito, feita a investigação e descartada outras fontes de embolização cerebral a opção pelo fechamento percutâneo do defeito septal deve ser fortemente considerada e discutida com o médico. Em alguns casos excepcionais pode-se optar por medicamentos antocoagulantes por toda a vida. Com o procedimento de fechamento estes medicamentos não serão mais necessários a longo prazo.

O procedimento consiste em colocar uma prótese tipo um guarda-chuvas no defeito septal atrial, fechando definitivamente o forame oval patente (FOP). Esta prótese normalmente tem dois discos. O fechamento do forame oval patente é realizado por uma punção na virilha com abordagem da veia femoral direita. A prótese é guiada por um cateter através da veia femoral, veia cava inferior, átrio direito e cruzada ao átrio esquerdo até a entrada da veia pulmonar esquerda, sob visão de ecocardiograma transesofágico e fluoroscopia, até ser posicionada no defeito septal. Este dispositivo é liberado e posicionado com rigoroso controle por imagem. Quando liberado(aberto) um disco fica no átrio esquerdo e outro no átrio direito, fechando o defeito. Após o dispositivo liberado e posicionado através do ecocardiograma transesofágico se examina se não há passagem de sangue de um átrio para o outro através do Doppler colorido e de teste com injeção de bolhas.

 

FOP: Após o procedimento

O local onde foi feita a punção será comprimido por alguns minutos ou utilizado um dispositivo de fechamento vascular. Assim sendo, o procedimento é realizado totalmente sem cortes. Portanto, a recuperação bem rápida, normalmente requerendo somente algumas horas na CTI ou sala de recuperação para monitorização do eletrocardiograma e pressão e alta hospitalar se dá em 1 ou no máximo 2 dias. Nos pós procedimento recomenda-se não levantar ou carregar muito peso por cerca de 30 dias até o dispositivo estar bem incorporado ao coração, para não correr risco de deslocamento. Após este período inicial não há mais risco de haver deslocamento do dispositivo.

Em poucos dias há condições de retomar as atividades habituais de trabalho. Contudo, quanto à prática de exercícios físicos tipo musculação o paciente deve combinar com o médico o período de retomada. Entretanto, normalmente após um mês todas as atividades podem ser realizadas, sem restrições.

 

TRATAMENTO TRANSCATETER DA INSUFICIÊNCIA MITRAL (MITRACLIP)

A insuficiência mitral é uma das principais causas de insuficiência cardíaca. A valva mitral está localizada dentro do coração, entre o átrio esquerdo e o ventrículo esquerdo. Abre para o sangue passar do átrio ao ventrículo e se fecha quando o ventrículo se contrai para direcionar o sangue para a aorta, e daí para todo o corpo.

Quando a valva mitral não se fecha bem durante a contração ventricular há o refluxo de sangue para dentro do átrio esquerdo, sobrecarregando o coração e reduzindo o volume de sangue que é bombeado para a aorta e para o resto do corpo. Com o tempo, se esta insuficiência for grave e não for tratada, há aumento do tamanho do coração com acúmulo de líquido nos pulmões. Falta de ar, cansaço ou palpitações são os principais sintomas. Como o problema do vazamento da valva é mecânico a solução é mecânica, sendo os medicamentos pouco efetivos em casos graves.

O tratamento mais utilizado é o reparo da valva doente (plastia) ou a troca valvar por uma prótese através de uma cirurgia convencional. Pacientes com idade avançada ou com doenças associadas, em que a cirurgia convencional apresenta um risco muito alto, o tratamento transcateter da valva mitral é uma alternativa recente. Em casos em que o coração já tem uma perda de função importante e dilata pode ocorrer uma insuficiência mitral por dilatação do anel mitral, o que é denominada insuficiência mitral secundária, pois a valva em si não é doente e sim o anel que dilatou. Estudos recentes demonstram que estres são os pacientes que mais se beneficiam do reparo mitral por cateter (MIraClip).

E o que é o MitraClip?

MitraClipR consiste em um pequeno clipe que é introduzido através de uma punção na veia femoral na virilha e, através de uma técnica minimamente invasiva. Ou seja, não possui cortes. Posteriormente, é levado até o átrio esquerdo e posicionado na valva mitral, que quando fechado une os dois folhetos da valva, reduzindo a insuficiência. O procedimento é guiado por métodos avançados de imagem como ecocardiograma transesofágico 3 D e fluoroscopia.

Sendo assim, este tratamento se aplica a pacientes com insuficiência mitral primária por doença degenerativa. Além de pacientes com insuficiência mitral funcional, secundária à redução da função e dilatação do ventrículo esquerdo.

Exames de imagem pré operatórios como ecocardiograma transesofágico 3D são fundamentais para definir aqueles pacientes que podem se beneficiar deste tratamento. Além disso, esses exames podem avaliar os resultados.

Estão sendo desenvolvidas também várias próteses mitrais por cateter, que em um futuro próximo farão parte do nosso arsenal terapêutico do tratamento da insuficiência mitral.

 

Cirurgia de revascularização do miocárdio (pontes de safena e mamária)

Pontes de safena e mamária: as artérias coronárias (vasos que levam sangue rico em oxigênio ao coração) podem ficar doentes, com estreitamentos e até a obstrução completa por placas de ateroma no seu interior. Estas placas são formadas por depósito de gorduras, colesterol, coágulos e outras substâncias. Estas obstruções levam à redução do fluxo de sangue ao coração podendo causar angina ou infarto. As pontes de safena e mamária, também chamadas de cirurgias de revascularização do miocárdio, são um tipo de cirurgia cardíaca na qual se faz uma ponte por cima do local com estreitamento ou obstruído. Com isto há uma melhora no fluxo sanguíneo e oxigênio ao coração. Se utiliza a artéria mamária (localizada no tórax) e/ou um segmento da veia safena (localizada na perna) para a realização destas pontes.

 

 Ponte de mamária (uma: em vermelho) e duas safenas (em azul)

O cirurgião retira um segmento de um vaso sanguíneo saudável de outra parte do corpo para fazer uma ponte e ultrapassar esta parte doente da coronária. A artéria mamária pode ser retirada de dentro do tórax, pela mesma incisão e suturada com a coronária, adiante do local da obstrução. Um pedaço da veia safena também pode ser utilizado, dependendo do número de pontes necessárias. Uma extremidade é suturada na coronária e a outra na aorta. Com as pontes implantadas o sangue utiliza este novo caminho para irrigar o músculo cardíaco.

A PONTE DE SAFENA E MAMÁRIA, TAMBÉM CHAMADA DE CIRURGIA DE REVASCULARIZAÇÃO DO MIOCÁRDIO, É UM TIPO DE CIRURGIA CARDÍACA NO QUAL SE FAZ UMA PONTE SOBRE UMA ARTÉRIA COM ESTREITAMENTO OU OBSTRUÍDA POR PLACAS DE GORDURA, MELHORANDO O FLUXO SANGUÍNEO E DE OXIGÊNIO AO CORAÇÃO.

 

Pós-operatório

Após a cirurgia o paciente permanece cerca de 2 dias em uma CTI cardíaca (POCC) com frequência cardíaca e pressão arterial monitorizadas de forma contínua. Logo que o paciente acorda o tubo da anestesia para respiração é retirado. São administrados medicamentos na veia para o controle da dor e, se necessário para a pressão. Os familiares podem fazer visitas 2 a 3 vezes ao dia. Após, o paciente é transferido para o quarto, onde permanece por mais 3 ou 4 dias.

 

Patologias valvares

As patologias valvares podem ser divididas em dois grandes grupos: as estenoses e as regurgitações ou insuficiências. As lesões valvares de ambos os tipos geram alterações hemodinâmicas nos ventrículos, produzindo uma disfunção ou diastólica ou sistólica, levando com o tempo a insuficiência cardíaca. Como regra cirúrgica geral, as lesões estenóticas podem aguardar o desenvolvimento de sintomas para indicação de intervenção. Já as lesões regurgitantes podem gerar uma disfunção ventricular importante e muitas vezes irreversível, enquanto o paciente se apresenta praticamente assintomático, sendo assim a indicação cirúrgica pode anteceder os sintomas. 

As disfunções valvulares podem ser sugeridas pela anamnese ou pelo exame físico. Independente destes achados a ecocardiografia trans torácica ou esofágica deve ser realizada em todos os pacientes com suspeita lesão valvular. A ecografia trans esofágica é o método mais sensível e com melhor definição de imagem. A ecocardiografia com Doppler é um método confiável e quantitativo na avaliação das patologias valvares, sendo sempre utilizado nas avaliações pré operatória e atualmente intra operatória. A ecografia é capaz de avaliar: a mobilidade, a presença de calcificação e a anatomia dos folhetos valvulares, o grau de hipertrofia ou dilatação ventricular, a fração de ejeção ventricular, o gradiente e a presença de regurgitação trans valvar. Permite também estimar a pressão arterial pulmonar e o cálculo da área valvar. Como método de avaliação complementar, mas não menos importante, o cateterismo cardíaco é importante na avaliação, pois fornece informações a respeito da anatomia das coronárias, do débito cardíaco, do gradiente de pressão trans valvar, da função ventricular e da área valvar. Sendo necessário no pré operatório para excluir doença coronariana em populações selecionadas.

 

ESTENOSE AÓRTICA (EA)

Etiologia: A EA pode ser subdividida em três categorias: subvalvar, valvar ou supravalvar. Em adultos, a causa mais frequente é a degeneração e calcificação valvar. Entre as causas menos comuns incluem-se: válvula unicúspide ou bicúspide congênita, estenose congênita sub ou supravalvar. Pode-se, também, dividir a frequência etiológica mais prevalente por faixa etária: até 30 anos, lesões congênitas; 30-65 anos, doença reumática e válvula bicúspide e após 65 anos, degeneração por calcificação. Manifestações Clínicas: A EA leva a uma obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo (VE) resultado em uma sobrecarga de pressão e hipertrofia concêntrica. Em decorrência da hipertrofia ocorre uma diminuição da complacência ventricular diastólica, neste momento o papel da contribuição atrial na manutenção do débito cardíaco torna-se fundamental, sendo assim o desenvolvimento de fibrilação atrial pode precipitar um quadro agudo de insuficiência cardíaca (IC). Os sintomas se desenvolvem geralmente quando a velocidade de fluxo ao Doppler maior que 4 m/segundo, a área de superfície valvar menor ou igual a 1 cm2 e um gradiente médio entre VE e aorta maior que 40 mm Hg. A tríade clássica de sintomas da EA é composta por angina, síncope e ICC. Aproximadamente 65% dos pacientes com doença grave apresentam angina pectoris. Síncope, principalmente ao exercício, ocorre em 25% dos casos. Dispnéia normalmente representa o desenvolvimento de insuficiência cardíaca. O desenvolvimento de sintomas é associado a uma mortalidade de 50% em 2 anos. Estes pacientes devem ser tratados com urgência.

Exame Físico: Na ausculta encontramos um sopro sistólico ejetivo com irradiação para as carótidas, melhor audível no segundo espaço a esquerda. Em 25-50 % dos pacientes encontramos um sopro de regurgitação concomitante. Na palpação podemos achar diminuição dos pulsos carotídeos e um ictus sustentado e fixo. 

Exames Complementares: ECG – Sobrecarga VE, em alguns casos bloqueio de ramo esquerdo. RX – Dilatação da aorta ascendente, calcificação valvular.

Indicação cirúrgica: Pacientes com angina, síncope e ICC têm indicação formal para troca da valva. Além destes, pacientes assintomáticos ou com mínima sintomatologia são candidatos a cirurgia se apresentarem área valvular < 0,7 a 1 cm2 ou gradiente de pressão transvalvar médio > ou igual a 40 mm Hg, especialmente se apresentarem hipertrofia ventricular ou doença coronariana concomitante.

 

INSUFICIÊNCIA AÓRTICA (IA)

Etiologia: Resultado de alterações na coaptação dos folhetos valvares, a IA tem como suas causas mais comuns a doença reumática e a degeneração mixomatosa. Outras causas de disfunção dos folhetos ou dilatação da aorta ascendente incluem: endocardite, necrose cística da média, sífilis, aterosclerose, doenças do tecido conjuntivo (síndrome de Marfan), doença inflamatória (espondilite anquilosante), hipertensão, dissecção de aorta ascendente, trauma e valva bicúspide. 

Manifestações Clínicas: A insuficiência aórtica pode ser dividida em aguda ou crônica. Associado a doença mitral. IA aguda não é bem tolerada devido a ausência da dilatação compensatória, resultando em dispneia, edema pulmonar agudo, isquemia miocárdica e choque cardiogênico. Insuficiência aórtica crônica leva a dilatação e espessamento da parede do VE. Os pacientes podem permanecer assintomáticos por muitos anos, entretanto, têm uma expectativa de vida curta após o aparecimento de dispneia, ortopneia, dispneia paroxística noturna, ICC e dor torácica.

Exame Físico: IA aguda pode apresentar na ausculta um sopro em rolar diastólico associado a B3 (Austin Flint) e estertores pulmonares. IA crônica apresenta circulação hiperdinâmica (pulso em martelo d´água), sopro diastólico em decrescendo, cardiomegalia, sopro de Austin Flint, e estertores pulmonares. 
Exames Complementares: ECG – Taquicardia sinusal, sobrecarga VE e desvio do eixo para esquerda. RX – Congestão pulmonar, cardiomegalia, dilatação da aorta ascendente.

Indicação Cirúrgica: O momento da indicação cirúrgica é fundamental, uma vez que a disfunção miocárdica irreversível frequentemente precede o aparecimento de sintomas. Indicações – sintomas ou evidência objetiva de descompensação ventricular (fração de ejeção < 50%, aumento do volume diastólico final do VE e diâmetro sistólico final do VE > 55 mm, avaliados pela ecocardiografia). Na vigência de cardiopatia isquêmica com lesões coronarianas documentadas por cateterismo e cinecoronáriografia, realizar revascularização do miocárdio no mesmo tempo cirúrgico.

 

ESTENOSE MITRAL (EM)

Etiologia: A causa mais comum é a febre reumática associada ao streptococus B-hemolítico do grupo A. Causas menos comuns são: doenças do colágeno vascular, amiloidose e estenose congênita. A fusão dos folhetos anterior e posterior pode ser severa o suficiente para impedir a sua movimentação dando aspecto de boca de peixe. A calcificação mitral é mais comum na superfície posteromedial da válvula.  

Manifestações Clínicas: A EM leva a uma sobrecarga de pressão no átrio esquerdo (AE). Dilatação do AE superior a 45 mm esta associada a uma alta incidência de fibrilação atrial e conseqüente tromboembolismo. A fibrilação atrial é responsável por uma diminuição de aproximadamente 20% no débito cardíaco. Estenose crítica se desenvolve quando a área valvar é menor ou igual a 1 cm2 (normal 3 cm2). Sintomas se desenvolvem tardiamente e refletem estado de hipertensão pulmonar sendo a dispnéia o seu principal representante. Inicialmente ocorre dispnéia aos esforços progredindo para repouso e finalmente ortopnéia.

Exame Físico: O paciente pode apresentar-se emagrecido chegando em alguns casos próximo a caquexia. Nos casos mais avançados podemos encontrar edema de membros inferiores, hepatomegalia e refluxo hepatojugular decorrentes da insuficiência cardíaca direita, que por sua vez decorre da hipertensão venocapilar pulmonar e hipertensão arterial pulmonar de longa data. Na ausculta apresenta um sopro apical em rolar diastólico, estalido de abertura e B1 hiperfonética nas fases iniciais evoluindo para B2 hiperfonética conforme a evolução da hipertensão pulmonar. 

Exames Complementares: ECG – Ritmo sinusal ou fibrilação atrial e sobrecarga atrial esquerda (“P mitral”) e ventricular direita. RX – Dilatação AE, em casos severos com hipertensão pulmonar surgem as linhas B Kerley. Indicação Cirúrgica: Pacientes sintomáticos classe III ou IV da NYHA, fibrilação atrial de inicio recente, piora da hipertensão pulmonar, episódio de embolização sistêmica, endocardite infecciosa ou área valvular < 1 cm2.

 

INSUFICIÊNCIA MITRAL (IM)

Etiologia: As alterações nos folhetos e na cordoalha de origem reumática são responsáveis por 35-45% dos casos. Calcificação de origem idiopática no anel e nos folhetos da mitral estão associados hipertensão arterial sistêmica, diabetes, estenose aórtica e insuficiência renal crônica. O prolapso mitral é um achado freqüente na população sendo sua incidência estimada em 3-4%. Destes apenas 5% desenvolverão doença clinicamente significativa. Sua principal causa é a degeneração mixomatosa do esqueleto fibroso do coração levando a um alongamento, adelgaçamento e redundância da cordoalha tendínea e dos folhetos. Nos países desenvolvidos esta é a principal causa de indicação para intervenção cirúrgica da valva mitral. A IM pode ser, também, de origem isquêmica, sendo definida como uma incompetência valvar de intensidade moderada a severa precipitada por um IAM. Sua incidência aproximada é de 3% sendo mais comum as alterações no músculo papilar posterior. Ruptura de músculo papilar ocorrem 0,1% dos casos pós IAM.

Manifestações Clínicas: As alterações fisiológicas associadas a IM são semelhantes as causadas pela EM; entretanto um aspecto em especial deve ser ressaltado, na IM ocorre uma sobrecarga de volume no VE e AE causando aumento e espessamento do VE e dilatação AE levando ao desenvolvimento de insuficiência cardíaca (IC). Fibrilação atrial se desenvolve com frequência agravando em 75% dos casos o quadro de IC. Hemoptise e tromboembolismo são sintomas raros. O desenvolvimento de sintomas está diretamente associado ao grau de hipertensão pulmonar. Dispneia aos esforços, ortopnéia e diminuição da resistência física são os achados mais comuns. Lesões de nível moderado e severo podem ser toleradas por muitos anos sem o desenvolvimento de sintomas exuberantes. É raro o aparecimento de sintomas significativos até o início de um quadro de IC, o que geralmente ocorre tardiamente no curso clínico. Como parte do volume sistólico do VE é ejetado para o átrio esquerdo (câmara de baixa pressão) a pós carga é baixa nesta situação, sendo que a função sistólica do VE pode se manter preservada em fases avançadas da doença. Com a correção cirúrgica ocorre aumento da pós carga pela eliminação da regurgitação e aí pode aparecer realmente a disfunção ventricular. Sendo assim, a severidade dos sintomas não deve ser usada como único critério de indicação cirúrgica. Três fatores são determinantes para quantificar a severidade de uma IM: o grau de regurgitação, a função e as dimensões do VE e a causa etiológica.

Exame Físico: Os achados físicos de IC são freqüentes. Na ausculta podemos encontrar um sopro holossistólico em ápice com irradiação para axila e dorso, B3, hiperfonese de B2 e circulação hiperdinâmica. 

Exames Complementares: ECG pode apresentar – hipertrofia de VE ou biventricular, além de hipertensão pulmonar. Rx – aumento do VD, congestão vascular pulmonar e linhas B de Kerley. Cateterismo – ondas V atrias proeminentes, aumento do volume e pressão diastólica final da VE e quantificação do refluxo. 

Indicação Cirúrgica: A cirurgia para correção da insuficiência mitral crônica é recomendada em pacientes sintomáticos com limitação no estilo de vida, IC classe III e IV da NYHA. Em pacientes classe I e II a correção cirúrgica é considerada se há fibrilação atrial de início recente ou evidência objetiva de descompensação ou dilatação progressiva do VE. Considerar a possibilidade da função ventricular esquerda estar superestimada pela baixa pós carga. Na cirurgia convencional, sempre que possível devemos buscar realizar o reparo (plastia) da valva.

O tratamento transcateter da insuficiência mitral (MitraClip) é uma alternativa menos invasiva à cirurgia convencional e apresenta melhores resultados na insuficiência mitral secundária e na primária mas com alto risco cirúrgico.

 

DISFUNÇÃO TRICÚSPIDE (DT)

Etiologia: Por apresentarem sintomatologia e tratamento semelhante serão discutidas em conjunto as afecções da válvula tricúspide. A insuficiência tricúspide é uma alteração funcional na grande maioria dos casos. Nestes, ocorre uma dilatação do anel valvar decorrente da dilatação ventricular direita e da hipertensão pulmonar. As causas mais comuns da insuficiência funcional tricúspide são: disfunção mitral ou aórtica, cor pulmonale, hipertensão pulmonar primaria, infarto de VD e cardiopatias congênitas.  

A estenose tricúspide é quase sempre de origem reumática e associada a patologia mitral. Outras causas incluem: endocardite bacteriana (drogaditos), tumor carcinóide e trauma fechado.

Manifestações Clínicas: Tanto a estenose quanto a insuficiência tricúspide geram um quadro de congestão venosa, hipertensão atrial direita, congestão hepática, grande retenção de líquidos com formação de edema, fadiga e fraqueza. Com a progressão da doença podem ocorrer insuficiência hepática, cirrose cardíaca, ascite, anasarca e insuficiência renal.

Exame Físico: sopro sistólico. Ao exame podemos encontrar hepatomegalia, pulso jugular proeminente e fígado pulsátil. Em casos mais avançados, o fígado pode se apresentar firme e fibrótico. Na ausculta encontramos um sopro semelhante ao mitral melhor audível em borda esternal inferior esquerda e com acentuação durante a inspiração. Caracteristicamente são sopros de difícil ausculta mesmo em casos severos. Pode haver ascite.

Exames Complementares: ECG – pode sugerir DT se, em ritmo sinusal, existe uma amplitude da onda P superior a 0,25 mV na derivação D II. Rx apresenta classicamente cardiomegalia com aumento do AE.  
Indicação Cirúrgica: A intervenção cirúrgica isolada é rara sendo recomendada apenas nos casos mais severos, sendo geralmente corrigida em conjunto com outra disfunção cardíaca. Preferência atual nas DT é pela anuloplastia ao invés da troca.

 

ENDOCARITE INFECCIOSA (EI)

Infecção de uma válvula cardíaca. Indicação cirúrgica: principais – instabilidade hemodinâmica, êmbolo séptico recorrente e evidência persistente de infecção com cobertura de antibiótico adequada e insuficiência valvar aguda severa. Relativas: insuficiência mitral ou aórtica moderada, bloqueio cardíaco e fístulas intracardiacas.

 

IMPLANTE TRANSCATETER DE VALVA AÓRTICA (TAVI/TAVR)

Saiba como funciona o implante de valva aórtica.

A estenose aórtica degenerativa é a doença valvar mais frequente em países desenvolvidos. Sendo assim, ocorre em cerca de 5% das pessoas com mais de 75 anos e decorre da calcificação dos folhetos da valva, dificultando a saída de sangue do coração para a aorta. Portanto, quando começa a dar sintomas (dor no peito, cansaço ou desmaios) a evolução é muito ruim e o risco de morte sem tratamento é alto.

Assim, a troca por cirurgia convencional constitui o tratamento de escolha para a estenose aórtica grave sintomática. No entanto, a estenose aórtica frequentemente acomete indivíduos em faixa etária elevada com doenças associadas. Sendo assim, estima-se que aproximadamente um terço dos pacientes com estenose aórtica sintomática sejam preteridos do tratamento cirúrgico pelo alto risco de mortalidade operatória.

Contudo, recentemente o implante por cateter foi desenvolvido como alternativa terapêutica menos invasiva para o subgrupo de pacientes com risco elevado para cirurgia convencional, seja pela idade avançada ou por doenças associadas. Estudos recentes mostram vantagens deste procedimento em pacientes com risco cirúrgico intermediário e baixo também, mas a princípio deve ser reservado para pacientes acima de 70 anos de idade.

Veja animação no link:

https://www.youtube.com/watch?v=gLcC-eG9-mY&list=PLsNdushDNb3xDCEYzsnV5I7gW_B8eWNSo&index=6

 

CORREÇÃO ENDOVASCULAR DO ANEURISMA DA AORTA

O aneurisma da aorta é uma dilatação localizada na parede de um vaso sanguíneo. Os aneurismas podem se formar em qualquer artéria do corpo, como as ilíacas, femorais, poplíteas e viscerais, incluindo artérias do cérebro. Porém, é mais comum se desenvolverem na aorta, a maior artéria do corpo. Os aneurismas podem se desenvolver em qualquer parte da aorta-torácica e/ou abdominal. O local mais comum de dilatação da aorta é na sua porção abdominal, logo abaixo das artérias renais.

O aneurisma da aorta é uma doença séria, pois, dependendo do tamanho, pode se romper causando hemorragia interna.

A maior parte dos aneurismas é descoberta de forma ocasional, através de um Raio X ou ecografia abdominal (solicitados por outra razão). A correção do aneurisma depois que se rompe nem sempre é efetiva. O ideal é a avaliação cuidadosa do tipo do aneurisma, da localização e do tamanho, para que, em casos indicados, a correção possa ser feita antes da ruptura.

 

Veja animação no link:

https://www.youtube.com/watch?v=9uYdQb-bLSA&list=PLsNdushDNb3xDCEYzsnV5I7gW_B8eWNSo&index=5

 

 Aneurismas da aorta torácica e abdominal.

Em geral os aneurismas de aorta não causam nenhum sintoma. Crescem silenciosamente, sendo de difícil detecção. Muitos começam pequenos e assim permanecem por anos. Outros crescem mais rápido por isto devem ser acompanhados com exames periódicos. Em geral os aneurismas maiores tendem a crescer mais e, quanto maior o tamanho do aneurisma maior a chance de ruptura. É como se fosse um balão (à medida que vai sendo inflado maior a chance de estourar).

Quando o aneurisma é grande ou está crescendo rapidamente, o paciente pode sentir sensação de pulsação no abdome, dor no tórax ou abdome (dependendo da localização) e dor nas costas. Grandes aneurismas também podem causar sintomas de compressão.

No exame o médico pode palpar o aneurisma abdominal, mas aneurismas pequenos e médios são difíceis de serem palpados, principalmente se o paciente for obeso. Todo o paciente com aneurisma e uma destas manifestações deve procurar seu médico com brevidade.

Sabendo disso, a principal complicação e a mais temida é a ruptura. Portanto, quanto maior o aneurisma maior a chance de romper. Uma vez roto há hemorragia interna. Sintomas de ruptura são: dor abdominal intensa e súbita com irradiação para as costas, tonturas associadas à pressão baixa, palidez, sudorese e desmaio.

Os aneurismas também frequentemente têm no seu interior coágulos sanguíneos. Estes podem se deslocar causando isquemia (redução na circulação). Esta isquemia pode se dar em território do cérebro em casos de aneurismas da aorta torácica e em pernas e dedos dos pés em casos de aneurismas de aorta torácica e/ ou abdominal. Esta complicação é mais rara.

E o tratamento?

Quanto ao tratamento, seu objetivo é a prevenção da ruptura. Nem todo o aneurisma deve ser tratado cirurgicamente. Contudo, o tratamento depende do tamanho, da localização, da taxa de crescimento e da saúde geral do paciente.

Portanto, como em qualquer procedimento médico a relação risco/benefício deve ser bem avaliada. Em geral, aneurismas de aorta abdominal menores do que 4 cm de diâmetro, sem sintomas podem ser acompanhados de perto com ecografia ou tomografia a cada 6 meses. Um aneurisma da aorta abdominal de 3,0 cm em um paciente de 80 anos pode ser muito bem acompanhado com exames seriados, enquanto um aneurisma abdominal de 6,0 cm de diâmetro em um paciente de 50 anos deve ser corrigido.

Contudo, em caso de observação é importante tratar a pressão alta, não fazer esforço físico grande que implique em aumento da pressão dentro do abdome e não fumar. Sendo assim, pode ser recomendado, se não houver contraindicações, o uso de medicação chamada beta-bloqueador, com o objetivo de retardar o crescimento do aneurisma.

Aneurismas de aorta torácica ou abdominal grandes, que estão crescendo ou dando sintomas devem ser tratados, e existem duas formas principais de tratamento: a cirurgia convencional e a cirurgia endovascular.

PERGUNTAS FREQUENTES

  • De que maneira o aneurisma é detectado?

    Geralmente os aneurismas da aorta são detectados por acaso durante a palpação do abdome por um médico, ou, mais frequentemente, por exames de imagem feito para outro fim, por exemplo: um homem vai fazer uma ecografia abdominal para avaliar a próstata e um aneurisma é detectado ou uma mulher realiza uma ecografia para avaliar cálculos na vesícula ou ovários e constata a presença do aneurisma. Os aneurismas da aorta abdominal são frequentemente identificados por ecografia do abdome já que são silenciosos. Já a forma mais frequente de detectar aneurismas da aorta torácica é o RX de tórax.

  • Todo aneurisma da aorta precisa ser tratado com cirurgia?

    Não. Em aneurismas pequenos, menores que 4 cm de diâmetro, a probabilidade de ruptura é baixa, então muitas vezes se opta por tratar a pressão arterial alta e acompanhamento de perto para ver se ele cresce. Muitos aneurismas pequenos permanecem assim por anos ou décadas. Sendo assim, cada paciente tem uma evolução diferente, por isto deve fazer uma ecografia abdominal de 6 em 6 meses e, em alguns casos tomografia para melhor avaliação. Quando o aneurisma atinge um diâmetro maior a chance de ruptura aumenta e aí devemos decidir qual a melhor forma de tratamento. Cirurgia convencional ou endoprótese

  • A cirurgia do aneurisma possui muitos riscos?

    A cirurgia tradicional, feita de forma aberta com cortes no tórax ou abdome, é um procedimento de grande porte. Apresenta risco que varia de 4% a 10 % de mortalidade para os aneurismas da aorta abdominal e de até 20 % para os aneurismas da aorta torácica ou tóraco-abdominal. Há também risco de complicações em outros órgãos e sistemas como pulmões e rins por exemplo. De qualquer forma ainda é um procedimento seguro, muito utilizado e tem a vantagem de termos seguimento a longo prazo, já que o procedimento tem várias décadas de existência. A cirurgia endovascular apresenta um risco durante o procedimento menor por ser menos invasiva.

  • Como funciona a técnica endovascular (endoprótese)?

    Sob radioscopia (filme de RX) intoduz-se um catéter pela artéria femoral na virilha com a endoprótese fechada dentro deste até chegar ao local do aneurisma. Neste local a endoprótese é liberada, fixando-se por dentro da aorta, excluindo o aneurisma da circulação e reforçando a parede fraca.

    O procedimento, por ser bem menos invasivo que a cirurgia aberta tem menor risco cirúrgico. Entretanto não é isento de problemas. Por se tratar de procedimento relativamente novo os resultados a longo prazo não são bem conhecidos. Podem ocorrer vazamentos (endoleaks) que em geral podem ser tratados com nova endoprótese. O tempo de internação é menor (média de 1 a 2 dias) e a recuperação mais rápida.

  • Há quanto tempo o senhor utiliza endoprótese, quantos casos já fez e quais os resultados?

    Iniciamos a nossa experiência em 2002 e até 2020 foram realizados mais de 1.000 procedimentos endovasculares, com mortalidade menor do que 1%. A maior parte dos procedimentos foi realizada totalmente sem cortes, somente por punção.” 

  • Todos os aneurismas podem ser tratados por via endovascular?

    Não. Temos muito cuidado na avaliação pré operatória porque os resultados do tratamento endovascular estão diretamente ligados a uma adequada seleção de pacientes. Na dúvida, em casos de aneurismas com anatomia desfavorável com colo curto, muito angulado, artérias muito calcificadas e anguladas ou finas não devemos forçar a indicação e optar por cirurgia aberta.

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